Publisher's Synopsis
Este livro foi escrito durante os quatro anos do período que vai desde a eleição de um genocida em 2018 para presidente da república até a eleição de Lula em 2022. Foram quatro longos anos que representaram uma tragédia para o Brasil e para o mundo, onde a negação da solidariedade, do afeto, da tolerância, da compaixão e do amor penetrou fundo na alma das pessoas. A intenção explícita era a destruição daquilo que nos anima a construir uma vida social cooperativa, digna, satisfatória e criativa dentro do respeito à diversidade individual e coletiva.
O resultado da eleição de 2018 se abateu sobre o Brasil como um flagelo e, ao longo dos primeiros anos, pode-se registrar a ocorrência sistemática e frequente de várias formas de violência - física e psicológica - dirigidas a grupos sociais diversos (favelados, homossexuais, negros, oposicionistas, professores, cientistas, etc). A disseminação destes comportamentos agressivos produziu verdadeiros monstros, pessoas que se acostumaram à um mundo paralelo absurdo e muito violento.
Transtornada, a sociedade procurou entender este fenômeno e desenvolveu formas de defesa, de sobrevivência, nos vários contextos onde os conflitos ocorriam com maior intensidade. Foi um período de grande esforço intelectual e organizativo na produção e compartilhamento de emoções, de compreensões, de conhecimentos e de práticas de resistência.
Nos últimos anos, já com a perspectiva da candidatura de Lula consolidada, a sociedade passou à se dedicar com maior intensidade à luta política, que era também a luta para recuperar as bases sociais da convivência democrática na diversidade, onde a solidariedade e as formas não violentas pudessem prevalecer. Infelizmente, grupos fascistas cresceram em popularidade e ousadia, para ainda tentarem intimidar a sociedade pelo medo e pela desorganização das várias compreensões de mundo. Assim, este é o lugar de onde falo, do meio de uma luta antifascista, que não se esgota com a eleição de Lula para presidente da república.
Este livro é fruto de minhas percepções destes momentos, mas dentro de uma perplexidade e de uma procura. Como pessoas conhecidas há muito tempo e familiares puderam comportar-se como monstros, como sociopatas ? Como puderam destruir toda afetividade que demonstravam na nossa convivência ? Quando foi que passaram a incorporar vocabulários e atitudes violentas ? Como puderam tripudiar diante do sofrimento, do ódio e da violência ?
Assim, sobreviver significou uma decisão de não aceitar o ódio e a violência regendo as relações sociais, impregnada de indignação diante da constatação da extensão dos danos já produzidos. Danos irreparáveis, como a morte de setecentas mil pessoas no Brasil, durante a pandemia. Além deste flagelo, ao longo destes anos, perdemos algumas de nossas mais preciosas referências culturais. E descobrimos a importância de reverberar a memória destas pessoas. Talvez, até mesmo como uma forma de fazer com que aqueles que amamos sobrevivam à toda finitude e toda fragilidade deste precioso cristal que nos anima.
Este não é um livro sobre política. É um livro sobre o que ocorre debaixo da pele diante dos "absurdamentos", diante da violência, do ódio e do preconceito. É sobre indignação, é sobre sofrimento, é sobre resistência, é sobre resiliência, mas é também sobre as condições que nos fragilizam e nos reduzem a seres biológicos que reagem somente com fúria ou medo.